Esna, Egipto
O cavalinho de pau era um santo. Bem empalado numa mola vermelha, tinha já orelhas de coala, de tanta cavalgada. No entanto, a dor era de somenos importância, face à humilhação. Tinha-se tornado - tornaram-no! - no equídeo mais indeciso do mundo. Sempre que decidia avançar numa certa e determinada direção, algo, ou alguém, o forçava no sentido contrário. Quando acedia em recuar, logo o esporeavam num ataque decidido. Isto repetia-se até à exaustão.
No início ainda culpou a mola vermelha, mas, sabia-o agora, esta era apenas um pau mandado de quem o montava às cegas. E havia-os de todos os tipos. Aos mais pequenos e leves de espírito ainda resistia, agarrando-se ao horizonte com firmeza. Mas os maiores e mais pesados, ah!... a dor, o sofrimento; vergavam-no até vislumbrar uma nesga de céu limpo, lembrando-lhe o empinar nos prados do planalto, para, de imediato, lhe afundarem o focinho numa areia abafada. No dorso, tinha uma sela de suor. Que suplício tão tolo.
Na altura certa (talvez um pouco cedo demais) foi canonizado e empalado num altar.
De vez em quando, sente saudades de uma vidinha mais agitada.