20090923

Ponte de Lima, Portugal Mesmo antes de arrancar a contagem do tempo, quando tudo se resumia dois pedacitos e meio de vazio e a gravidade dos assuntos era igual a zero, deu-se a primeira grande manifestação de pensamento conceptual criativo. O grande nada, encarado como infrutuoso e demasiado vazio originou, num golpe de génio, a ideia do promissor tudo; e num deadline apertado. O procedimento que leva a este tipo de absurdo-aparente pode ser executado substituindo o sistema de raciocínio cerebral clássico por um mecanismo de exercício conceptual totalmente oposto como, por exemplo, a reflexão in pés. Abordar as questões por hemisférios alternativos aos usuais, pontos sensoriais com experiências totalmente diversas do comum, resulta em respostas muito díspares das neurologicamente programadas e, usualmente, mais originais. Podemos também raciocinar sem pés nem cabeça, utilizando práticas mais subtis como a reflexão de anca, o juízo inguinal, a sistematização de cotovelos, a lógica biliar ou, em casos muito particulares, o intelecto abdominal. Algumas das mais extraordinárias manifestações criativas da história foram corporizadas sem qualquer tipo de actividade neurológica. Uma das mais reveladoras conferências TED de 2008 em Monterey, na Califórnia, sob o tema "The brighter sparks of dark places", foi apresentada por um eloquente sovaco, mestre summa cum laude em Berkeley. Existem várias representações impressionistas no Musée d'Orsay da autoria de uma grotesca barba hirsuta, considerada uma das produtoras de arte mais criativas dos finais do século dezanove. O museu do Cairo destaca em sala própria um vaso funerário da dinastia Ptolomaica que se acredita conservar os restos mumificados do único joelho que governou o antigo Egipto. Estas mesmas linhas foram escritas por uma glote inflamada, sem qualquer intervenção intelectual.

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