Brufe, Portugal
O escritório disponibiliza aos funcionários um espaço de lazer no mais profundo das suas instalações. Convenientemente perto dos cubículos sanitários mas afastado o suficiente para não os sentir como próximos, este lounge equipado e funcional faz janela com o exterior. Daqui apreciam-se as vistas, fuma-se e sorvem-se intermináveis cafés. Quando o tempo permite entreabre-se uma frincha para libertar o fumo. Vista das traseiras do prédio a janela é como um tubo de escape de uma máquina a carburar em ponto morto. Um andar parado num engarrafamento de pisos. Como explica o pesado gradeamento abraçado à janela, este quartinho dos fundos é um espaço seguro. Mantém a ferros a integridade física dos de fora e dos de dentro. Por ali só se esgueiram as pombas. Por ali só se escapam as mágoas.
Mas a morte ronda perto. De facto, todo o horizonte da janela é tomado pela morte. Não a morte seca, arrancada de súbito e a frio, mas a morte composta. Encenada e vistosa. A morte como é imaginada pela vida temerosa. A morte reverenciada com cautela. Um vasto cemitério, dos mais ricos da região, empareda o horizonte. As cruzes e as lápides sucumbem aqui à opulência dos mausoléus. Uma cidade silenciosa na toponímia, gótica nos telhados, pisos e jardins, e viva no bulício dos gatos e das pombas. Só os vivos aqui se mexem como mortos. Figuras paradas e cinzentas, cabisbaixas e de expressão dura como a estatuária.
Da janela tem-se uma vista privilegiada sobre esta cidade. Da janela está-se condenado a ver a morte atrás das grades.