20110509

Kbal Spean, Cambodja Na estação fresca, entrou um homem com uma barba, qual arbusto desgovernado, e uma mulher de cabelo em copa densa, mais permanente que perene, caindo em pontas de chorão. O homem cofiava o arbusto com a mão em ancinho, de dentro para fora, com uma discrição tal que apenas se notavam umas falanges de pardal a assomar aqui e ali, chilreando de contentamento. A mulher não fez caso e abanou ligeiramente a cabeça. Um casal de melros que ali se debicava nas respectivas penugens, esvoaçou aflito, para logo voltar a se afundar na folhagem espessa. Levado pela brisa fria o homem infestante encostou-se a ela, cobrindo-lhe o tronco com uma sebe desgrenhada de onde começaram a despontar centopeias de raminhos trepadores, verdes e nervosos e brilhantes. A mulher sacudiu-se, na tentativa de abrir uma clareira, mas as luras das lebres, nas raízes, fizeram-na tropeçar. O vento caiu, a aragem gelou e o bosque emudeceu, enquanto a imensa árvore adornou, lenta e pesadona, arrastando consigo o arbusto apaixonado. Na queda, ela aceita e consuma aquele amor, estatelando-se ambos numa cama de folhas secas, felizes pelas gerações de larvas e coleópteros que lhes irão sobreviver.

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