20111204

Marraquexe, Marrocos A cotovia voava alto sobre os mortos, - carroças e carroças de laranjas deixavam-no bem claro - semicerrando os olhos ás fumarolas de incenso. De quando em quando, admoestava os crentes com uma voz roufenha, mas eram poucos os tapetes que sacudiam os ombros. Havia de tudo, na praça: homens rentes ao chão, a soprar cobras e lagartos, outros, enormes, de cabeças afiadas e uns espantalhos coloridos e farfalhudos, que agitavam quinquilharias para afugentar a sede. Quem por ali passava, esquecia as peias e dava cambalhotas para trás, como um macaco. Os mais cuidadosos, achavam por bem assistir a tudo de longe, mas o toque do batuque esticava a pele e eriçava de tal maneira as virilhas, que o engodo esfarelado desaparecia num instante. Na cidade vermelha de sangue nas faces, faziam-se amigos. Na cidade vermelha de sangue nas fezes, compravam-se inimigos. Uma vez, uma pomba enfunada teve um lençol de músicos escuros a tocar só para ela; uma outra, uns homens de vestido comprido, como mulheres, abandonaram as mulheres soturnas, como homens, e foram-se lavar, nas extremidades. Se, depois disto, referirmos ainda que a pele perde o pelo em cal viva e endurece com excrementos, vão achar que nunca saímos do sítio; que andamos ás voltas.

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