Barcelona, Espanha
Um gato reflete-se numa poça. A poça estremece, consciente da sua própria profundidade. O gato vê-se a tremer e toma consciência de que é apenas uma representação, um ato de uma boa peça. Toda a cena está a ser vista por um cego, que sentiu o cheiro a urina.
Uma parede áspera trespassa dolorosamente o gato, explicando-lhe que faz aquilo por piedade. O gato agradece, em silêncio, ser poupado a ver a sua decomposição.
A poça é agora um pórtico trabalhado e o gato uma mancha de pelo no chão. Caravanas de piedosos cruzam diariamente aquele tapete gasto, vindos do deserto. Mas o calor é tanto que o pórtico escorre, seca e desaparece, deixando todos muito confusos. Cegos pelo sol, olham o chão e vêm-no em pé, com um gato a urinar. A poça morna onde estão deitados, engole-os, ligeira.
O cego, satisfeito por ter assistido a tal momento, lambe demoradamente uma das patas, depois a outra, e vira costas ao espelho, ronronando de superioridade.
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